quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Poutz... assisti um filme.


Um Cão Andaluz (Um Chien Andalou), de Luis Buñuel, 1929.

Freud afirma que os sonhos são sistemas de símbolos acumulados e que, por esta propriedade, devem ser interpretados de maneira lógica. Inspirado por estes novos conceitos, em meados dos anos 20, André Breton se desgarra de seus parceiros dadaístas e propõe aos artistas e escritores, ao publicar seu primeiro manifesto do surrealismo, que expressassem o pensamento de maneira livre, espontânea e irracional, externando os impulsos da vida interior, sem exercer sobre ele qualquer controle, inclusive de ordem estética ou moral. O surrealismo, então, se caracteriza por um paradoxo ou um conflito que gera uma nova realidade, a surrealidade.

Os surrealistas, desta forma, passaram a utilizar os sonhos, as fantasias e todo material advindo do subconsciente através do que chamavam de automatismo consciente para a construção de suas obras.

Em Um Cão Andaluz, Luis Buñuel e Salvador Dali justapõem deliberadamente imagens que corriam em seus sonhos, sem qualquer lógica, violando a narrativa clássica. No filme, assim como nos sonhos, há deslocamentos de tempo e espaço. A ruptura de tempo ocorre através dos intertítulos que no lugar de auxiliar a construção narrativa, destroem-na. Já o deslocamento espacial se faz por um uso oportunista das locações. A rua e a praia ocupam o mesmo espaço fora do apartamento.

Seria muito vago ou deveras subjetivo de minha parte buscar uma interpretação para este filme. De fato, desde seu lançamento todo o tipo de interpretação já foi feita a seu respeito; desde “seu enredo seria uma viagem à mente perturbada de um assassino e as suas confissões traduzidas em imagens” até menções anti-cléricas. No entanto, o próprio Buñuel certa vez afirmou que qualquer idéia racional, preocupação estética ou técnica seria irrelevante e descartada. O que acontece, no entanto, é um efeito no qual o espectador busca por sentidos e lógicas, interpretações presas nos valores vigentes.

O único objetivo aparente em Um Cão Andaluz, no final das contas, é a busca por uma expressão artística que se refere não ao modelo externo, mas sim a outro, o interno, não condicionado por modelos culturais. Para Buñuel e Dali existe outra realidade, tão real e lógica como a exterior, que é a dos sonhos, da fantasia, dos jogos espontâneos do inconsciente que se desenvolve a margem de toda a função filosófica, estética ou moral. O filme quer transcender o mundo tangível e desvelar aos espectadores um universo até então desconhecido, encoberto pela percepção cotidiana das coisas.

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